*Juliano Costa Couto, Advogado, Mestre em Direito Constitucional e Consultor Jurídico da Fenavist
É inegável e incontroverso que o sistema tributário brasileiro é um dos mais complexos – e caros – do mundo, como bem já afirmou, em 2019, o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), hoje extinto. Próximos de nós em ‘tristeza tributária’ estão Colômbia, Egito e Zimbábue, a título de exemplo. Segundo o grupo Doing Business do Banco Mundial (2018), em nenhum país do mundo as empresas perdem tanto tempo com a burocracia tributária como no Brasil. Aqui gastam-se, em média, 1.500 horas por ano, enquanto no país líder, Suíça, o gasto é de 63 horas[1].
Diante desse quadro caótico, qualquer ideia e/ou hipótese de ‘reforma’ e/ou de mudança tende a projetar o sentimento de avanço, com perspectivas de melhoras, até mesmo porque pior do que está não fica. Infelizmente não é esse quadro de agora, vivenciado pelas “propostas” de reforma tributária do atual governo.
As principais propostas legislativas em debate hoje no Congresso são o PL 3.887/2020, que prevê a criação da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) que substituirá os tributos PIS/Pasep e Cofins. A CBS se diz inspirada nos modernos modelos internacionais de Imposto de Valor Agregado (IVA) de tributação uniforme do consumo. O outro projeto é o PL 2.337/2021 que, no discurso do governo[2], “traz avanços na tributação sobre a renda de famílias e empresas. A mudança corrige distorções, reduz privilégios, diminui a cobrança de imposto de renda dos trabalhadores, estimula o investimento nas empresas e racionaliza a tributação de várias aplicações financeiras para beneficiar os pequenos investidores”. Além desses PL´s, tramitam também no Congresso as PEC´s 45 e 110, com previsão de unificação de tributos, mas cujo ambiente para sua aprovação está bem enfraquecido, fazendo com que o governo priorize as reformas infraconstitucionais.
Além da questão da exagerada burocracia e complexidade, temos ainda que o Brasil é um dos países com a mais alta carga tributária do mundo, ocupando o 14º lugar no ranking[3], o maior da América Latina. Tal quadro faz com que o país dos sonhos, além de racionalizar as operações tributárias, também as diminua. No entanto, convenhamos que, em uma república federativa, com federalismo orgânico e mais de 5.000 municípios, essa tarefa não é fácil.
De maneira geral, a percepção do setor produtivo e dos meios jurídicos especializados é de que as propostas aqui analisadas não trazem os necessários avanços. No dia 24/8/2021 tornou-se público o 3º. Manifesto contra a reforma tributária, que reuniu mais de 60 entidades. O primeiro e o segundo já haviam unido mais de 70[4].
Importante registrar que a ideia de tributar os lucros e dividendos não é novidade. Até o ano de 1995 os lucros e dividendos eram tributados no Brasil na alíquota de 15%, até que entrou em vigor a Lei nº 9.249/95. Outros projetos já foram iniciados ao longo dos anos e nenhum deles até agora obteve sucesso, como é o caso da PL 3007/2008 e a PL 1619/2011, que também possuem previsão de tributar lucros e dividendos.
A ideia de tributar lucros e dividendos se apoia no argumento de que o sistema tributário brasileiro seria injusto com os mais pobres, pois ele é baseado em impostos indiretos. Isso significa que, quanto aos impostos que incidem sobre os produtos, ou seja, independentemente da renda, o mais pobre e o mais rico pagam a mesma carga de tributo quando compram o mesmo produto.
A tributação dos lucros e dividendos tem como base a tributação direta, que incide diretamente sobre a renda de uma pessoa, quanto maior a renda, maior o tributo, afastando-se possíveis injustiças. Além disso, o Brasil é um dos poucos do mundo que não tributa os dividendos, segundo a Tax Foudation[5].
A explicação ou justificativa vem desde 1995, quando entrou em vigor a Lei nº 9.249/95 que, majorando a alíquota de IRPJ, gerou uma antecipação do seu recebimento por parte do ‘Leão’, que não precisava mais “aguardar” a distribuição dos lucros por parte das empresas.
Da proposta da reforma do IR, temos como positiva a ideia da atualização das faixas de isenção de IRPF, muitíssimo defasadas. Em 1996, a isenção do tributo beneficiava quem recebia até nove salários mínimos – relação que caiu para dois salários mínimos em 2018, chegando a 1,73 em 2021[6]. Cabe registrar que a atualização das faixas foi promessa de Bolsonaro na campanha eleitoral de 2018.
Outro ponto tido como positivo é a possibilidade de atualização dos valores dos bens declarados no imposto de renda, com o pagamento do imposto de 4%, afastando-se a incidência da alíquota de ganho de capital de 15% a partir de valores históricos, marcante injustiça.
Dentre as muitas críticas ao projeto, destaca-se o entendimento de que a proposta tende a ensejar estímulo à sonegação, com distribuição disfarçada de lucros e/ou aumento artificial de custos, além da ausência dos necessários debates sobre o tema que, além de complexo, interfere diretamente na vida de milhões de brasileiros.
Outro ponto da norma tido como negativo é a limitação de renda até R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) anuais para que seja permitida a utilização da declaração de imposto de renda de forma simplificada, ou seja, quando as despesas são abatidas da base de cálculo de forma presumida. Há uma compreensão de marcantes prejuízos, com maior oneração para grande parte da classe média.
Assim sendo, como visto, temos que esses projetos, em especial o que trata das mudanças no imposto de renda, estão em descompasso com os anseios do setor produtivo, não representando avanços nem modernização do sistema tributário brasileiro, deixando clara apenas a sanha arrecadatória do Estado, que não dá as devidas contrapartidas. Nessa linha, a Fenavist está atenta aos trâmites dos projetos e os monitorando, trabalhando em prol dos anseios de seus representados.
[1] https://www.sigalei.com.br/blog/reforma-tributaria-no-brasil
[2] https://www.gov.br/economia/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/reforma-tributaria.
[3] https://andrebona.com.br/voce-sabe-quais-sao-os-paises-que-mais-cobram-impostos-no-mundo/
[4] https://www.conjur.com.br/2021-ago-24/manifesto-reforma-tributaria-guedes-reune-62-entidades
[5] https://forbes.com.br/forbes-money/2021/07/por-que-o-brasil-e-um-dos-poucos-paises-do-mundo-que-nao-tributa-dividendos/
[6] https://g1.globo.com/economia/imposto-de-renda/2021/noticia/2021/02/19/tabela-do-ir-acumula-defasagem-de-113percent-saiba-quanto-seria-o-imposto-com-correcao.ghtml
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